domingo, 26 de dezembro de 2010

GELERT

Aqui vai a poesia prometida. Antes, porém, uma singela homenagem aos nossos mais fiéis e sinceros amigos.

O primeiro foi batizado, como disse no outro post, com um nome encontrado no poema. Era um vira-lata muito bonito, de estatura média, com pelo macio e manchas brancas e marrons. Foi meu fiel escudeiro por praticamente toda a minha infância. Fazia sozinho o trajeto de alguns quarteirões da nossa casa para a casa da minha avó paterna e vice-versa. Quando não estava em uma, estava na outra. Na hora do almoço e do jantar sentava no chão ao lado da minha cadeira e apoiava a cabeça na minha perna. Lá ficava quieto. Eu pegava um pedaço de bife ou do que estivesse comendo, mostrava para ele e largava no ar. Não errava uma bocada! Dormia quase sempre no tapete ao lado da minha cama e me seguia quando eu ia andar de bicicleta.  Tomava banho com sabonete e shampoo, mas, como vivia livre, era sempre cheio de pulgas.

Meu pai comprou os instrumentos musicais da Irmã Teresinha, minha primeira professora de Música, quando a Ordem religiosa que administrava o Colégio S. José resolveu mudar de cidade. Nossa casa tinha, além do Piano, Acordeon, Marimba e Gaita, para citar alguns. Meu cachorro não podia ouvir qualquer desses istrumentos que começava a uivar. Das duas, uma: tentava cantar ou vaiar. Até hoje não sei exatamente.

Mudamos para Belém e ele ficou com nossos parentes. Pouco tempo depois, morreu. Diz minha mãe que foi saudade... mas ele já estava velho também.

Os outros foram: Lulu (vira-lata), Laila (Pincher), Blaublau (Dálmata), Plumma e Toti (Poodle) e, por fim, Milli e sua filha Filó (Doberman). São muitas histórias que, infelizmente, não cabem aqui.

Milli, Neto e Dalila - Fortaleza

A MORTE DO CÃO

Dom Augusto da Silva

  Chamavam-no Gelert. Soberbo cão de raça,
Que um caçador famoso, um doido pela caça,
Mandara vir de fora a peso de dinheiro.
Era o ídolo o cão; e, ao carinho tão doce
Dos agrados gentis, o cão acostumou-se
A consagrar também a vida ao companheiro.

Na época melhor das ótimas caçadas,
Os dois partiam sós, à luz das alvoradas,
Buscando o coração misterioso das matas,
E voltavam depois, alegres e contentes
Despertando em redor os íncolas dormentes,
Ao compassado som de estranhas serenatas.

Quantas vezes na caça os dentes das panteras,
O bramido soturno e tétrico das feras,
Que perigos passou, quanta arriscada empresa
Ameaçavam do cão o derradeiro instante…
Não sofrera fiel, para apanhar a presa,
Que ao dono provocasse um bravo delirante!…


Mas, depois de algum tempo, o cão envelhecido,
Desdentado, sem força, exausto, entorpecido,
Já bem dificilmente acompanhava o dono.
Era um cão sem valor, inútil companhia,
Que preciso se fez, de dia para dia,
Ir deixando ficar em mísero abandono.

A fortuna também girou rapidamente;
E o velho caçador tão rico, de repente,
Sentiu minguar-lhe o pão, sentiu faltar-lhe o ouro;
A morte lhe roubara a esposa muito amada,
E ele viu sua casa erma e abandonada,
Tendo um filhinho só por único tesouro.

Um dia, disfarçando o peso da desgraça
Que aos poucos lhe esmagava o triste coração,
Ele partiu, contando as emoções da caça,
Mas quis partir sozinho, e acorrentara o cão.

Do mísero cativo a pérola do pranto
Descera, mas ao ver o caçador contente,
O pobre cão lá foi, resignado, a um canto
Deitar-se, carregando o peso da corrente.

A noite que descia,
Em silencio profundo e em trevas envolvia
A casa. De repente
Ouve-se estranho passo. E, logo, frente a frente,
Sinistro, ameaçador, enfurecido,
Farejando a amplidão, faminto, um lobo avança.

E lá no berço a criancinha dorme,
Como dorme no berço uma criança…
Nesse momento,
No turvo olhar do cão lucila um pensamento.

O lobo se aproxima… escancarada a porta
Encontrava-se então… Eis, repentinamente,
Gonindo, uivando, o cão forceja, torce e corta,
Num ímpeto de amor, os elos da corrente.

Travou-se, então, uma horrorosa luta,
No silencio da noite, indiferente e bruta…
Surdo ranger de dentes,
Ossos a estralejar, em ímpetos frementes,
E contrações de dor, entre urros e gemidos.

Mil instintos da raiva, em gritos comprimidos,
Na sede da vingança, e os baques pelo chão,
Tudo acordava, em torno, a quieta solidão…
E o sangue a borbotar, e o fogo do cansaço,
E a relva, machucada, espalha pelo espaço
Um acre odor de guerra…

Depois… o baquear de um corpo em cheio em terra,
Depois… um abafado e último gemido…
- Um preito ao vencedor por parte do vencido;
Depois diminuindo e, gradativamente,
Vagaroso arrastar de um corpo indiferente.
Depois... depois mais nada!
Era a tragédia finda e a noite sossegada…

Mais tarde, ao despertar da fresca madrugada,
O caçador voltara.
E vendo a porta aberta, e a casa palmilhada
Com o sangue do cão,
Corre para o filhinho… anseia… estua, pára,
Ao ver ensangüentado o berço da criança;
Louco de amor paterno e louco de vingança,
Apanha junto ao peito o cabo do punhal,
E vendo, aos pés, a festejar-lhe, o cão,
Atira um golpe rijo ao peito do animal,
Que exânime resvala em último estertor.

Mas nisto, ouve uma voz que chama o caçador:
“Papá… Papá!” Alucinado, incerto,
Ouve a voz do filhinho... (o filho estava perto!)
Correu, e espavorido, atônito, absorto,
O foi achar contente, sossegado,
Junto à casa do cão e ali bem perto, ao lado,
O lobo enorme ensanguentado e morto.

Illustration of the legend of Gelert (1845–1894)
Charles Burton Barber

O CÃO REAL DO PAÍS DE GALES
(Texto original neste link)

Uma das vilas mais bonitas do Paí­s de Gales é Beddgelert, que fica na junção de três vales, no condado de Gwynedd.

Milhares de visitantes de todas as partes do mundo vão para lá todos os anos, mas não é devido aos jardins ornamentais ou pelas atraentes lojas de souvenir. Há uma razão especial para esta vila ser tão popular e tem tudo a ver com um incrí­vel cão real.

O cão, Gelert, é uma das maiores lendas do Paí­s de Gales e sua estória aquece o coração dos amantes de animais. O nome da vila, Beddgelert, está fortemente ligada a esta estória romântica e se traduz literalmente como "o túmulo de Gelert"- o nome do leal cão do príncipe Llywelyn, que reinou esta parte do Paí­s de Gales muitos séculos atrás.

Gelert nasceu no castelo do rei John da Inglaterra, que reinou entre 1199 e 1216, e quando a filha do rei se casou com o prí­ncipe Llywelyn, o filhote foi dado a eles como presente de casamento. Gelert cresceu e se tornou um cão de caça corajoso e conhecido por sua lealdade. Com o passar do tempo, Llywelyn ficou cada vez mais apegado ao cão e Gelert era sempre visto ao seu lado. Em um curto perí­odo de tempo Gelert foi nomeado líder da matilha de cães do prí­ncipe, pois não havia outro que tivesse a sua persistência e força.

Cerca de um ano mais tarde, a esposa do prí­ncipe deu a luz a um lindo garoto. Gelert se encantou com o bebê e ficava noite e dia ao lado do berço. Ele recusou-se a ir caçar com o prí­ncipe um dia e parecia preferir ficar guardando o bebê enquanto ele dormia no berço. Embora Llywelyn sentisse muito a falta do animal, entendia que o cão precisava proteger a famí­lia e por isso não forçou Gelert a acompanhá-lo. Llywelyn sabia que no final do dia Gelert sempre estaria esperando no portão do castelo pelo retorno do seu senhor.

Um dia Llywelyn voltou para casa e encontrou seu fiel cão no portão. Ao se aproximar, ficou horrorizado em ver sangue no focinho e corpo de Gelert. O prí­ncipe correu para dentro do castelo e para o quarto de seu filho. Não havia sinal do bebê, mas o berço estava virado e as cobertas da criança estavam caí­das no chão, encharcadas de sangue.

O prí­ncipe ficou com o coração partido e concluiu precipitadamente que Gelert, com ciúmes, matara o bebê enquanto estava caçando. Em um ataque de raiva, Llywelyn sacou sua espada e matou Gelert. Mas quando Llywelyn caiu de joelhos chorando, seus gritos foram respondidos pelo choro do bebê.

Llywelyn endireitou o berço e encontrou seu filho embaixo dele. O bebê não tinha sofrido mal algum e estava dormindo tranqüilamente dentro do emaranhado de cobertas no chão. Enquanto o príncipe colocava seu filho no berço pode ver a cauda de um animal embaixo de um dos cobertores. Lá estava o corpo de um grande lobo que havia sido morto por Gelert enquanto tentava atacar o bebê dentro do berço.

A estória conta os remorsos do prí­ncipe. Tentando mostrar ao mundo o quão orgulhoso era de seu leal Gelert, enterrou o cão nos arredores do castelo e deu-lhe um enterro digno de um rei. É dito que o prí­ncipe e seu filho visitavam o local freqüentemente e que ordenou que o local fosse conhecido como Beddgelert, em memória a seu amado cão.

Embora pareça uma estória triste, a lenda do corajoso Gelert tem lugar nos corações de gerações de amantes de cães ao redor do mundo. Ela continua sendo uma maravilhosa estória que toca os corações das milhares de pessoas que visitam o local. E a lealdade de Gelert, o verdadeiro cão real do País de Gales, vive nos corações de muitos.

(em memória do meu pai e do nosso fiel amigo Gelert)
(CONHEÇA O SEU IDIOMA, Vol. 2, Páginas 189-191)

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