quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

FELIZ NATAL MUSICAL!



Nesta época do ano é muito comum, no Brasil, ouvir corais cantando pelas ruas, praças e centros comerciais. Considero particularmente interessante certos aspectos desse tipo de manifestação artística e apresento aos meus grupos algumas observações que reproduzo aqui. Antes, porém, um pouco sobre a figura do regente.

No futuro talvez seja diferente, porém, nos dias atuais, quem rege, para alcançar um resultado, depende de pessoas, de gente com pensamento e vontade própria. Um grande desafio.

O artista plástico, para pintar um quadro, usa pincel e tinta. Instrumentos sem cérebro. Nunca o roxo vai questionar se o artista preferir azul ou vermelho. O pincel nunca terá problemas familiares e faltará a uma semana de ensaio. Já o regente, para finalizar uma obra, precisa da boa vontade, da colaboração de um grupo complexo que deve ser liderado, administrado e conduzido de forma harmoniosa para um resultado final. Não é fácil.

Nesse contexto, alguns maestros são conhecidos como tiranos, ditadores, autoritários e prepotentes, enquanto outros são bonzinhos, democráticos, liberais etc. No “Ensaio de Orquestra”, de Fellini, tal figura chega a ser substituída por um grande metrônomo. Nunca me importei se um regente é isto ou aquilo, mas sim com o som que ele produz, não me interessa como, afinal, para qualquer lider será sempre muito difícil escapar da vontade da horda de “matar o pai, tomar seu lugar e tripudiar sobre seu cadáver, no melhor estilo edipiano.”

Na minha caminhada diante de grupos corais, tentei ser um misto de ambos os tipos. Democratizava o que era possível e tiranizava o impossível. Assim, dividia tarefas administrativas, fazia eleição para chefes de naipe, coordenadores, tesoureiros etc. Porém, quando se tratava de música, a palavra pertencia só a mim e mais ninguém, pois quando um coro faz bonito, todo o grupo recebe elogio, mas quando vai mal, a única informação que pedem os ouvintes é: “Qual o nome do maestro?” Vale a assinatura no quadro. E sempre assinei o que produzo, mal ou bem. Com alguns grupos convivi pacificamente por décadas. Com outros, o divórcio foi inevitável.

Ninguém é obrigado a participar, mas, ao integrar um coral, o coralista deve confiar, estar ciente e concordar em ceder sua voz como instrumento de trabalho do regente. Essa relação implica respeito recíproco. Quando isso não ocorre, o atrito é fatal. No meu caso, sempre priorizei a música. A minha música. O resto era lucro ou prejuízo.

Pensei esta introdução para ajudar a esclarecer um pouco mais o que pretendo escrever sobre o repertório de Natal, período capaz de mexer com a emoção das pessoas. Tem gente que se deprime, sente saudade, chora. Conheço quem, no dia 24, toma remédio para dormir profundamente e, se possível, acordar só no dia 26. Tem gente que se alegra, confraterniza com amigos e familiares, brinda o aniversariante, enfim, tem de tudo. Mas... e a trilha sonora? Chegamos ao ponto: maestro + coralistas + repertório = NATAL. Natal?

Sugiro parar e observar o próximo coral, principalmente em palco de shopping center, como canta esta música:

Anoiteceu, o sino gemeu
E a gente ficou feliz a rezar
Papai Noel, se você tem
A felicidade pra você me dar

Eu pensei que todo mundo
Fosse filho de Papai Noel
E assim felicidade
Eu pensei que fosse uma
Brincadeira de papel

Já faz tempo que eu pedi
Mas o meu Papai Noel não vem
Com certeza já morreu
Ou então felicidade
É brinquedo que não tem.

Além do Português sofrível, é quase certo que o grupo cantará essa música de maneira alegre, talvez até dançando e com um enorme sorriso no rosto. O ritmo é animado! Mas... e a letra? Deprimente. Para o autor, Assis Valente, “felicidade é brinquedo que não tem” e, provavelmente por esse motivo, cometeu suicidio. Morreu como o Papai Noel da poesia na qual é figura principal. O aniversariante da data nem citado é.

E esta, que considero uma das melhores adaptações de música estrangeira natalina para o idioma Português, como será que o coral em cena irá cantar?

Noite feliz, noite feliz
Ó senhor, Deus de amor
Pobrezinho nasceu em Belém
Eis na lapa Jesus, nosso bem
Dorme em paz, ó Jesus
Dorme em paz, ó Jesus

Noite feliz, noite feliz
Ó Jesus, Deus da luz
Quão afável é teu coração
Que quiseste nascer nosso irmão
E a nós todos salvar
E a nós todos salvar

Noite feliz, noite feliz
Eis que no ar vêm cantar
Aos pastores os anjos do céu
Anunciando a chegada de Deus
De Jesus, salvador
De Jesus, salvador

Na parte que diz Dorme em paz..., o volume e a forma cantada permitirão um sono tranquilo a uma criança que acabou de nascer? Que dizer da expressão facial? Noite Feliz... todo mundo triste ou, de fato, feliz?

A primeira música nunca fará parte do meu repertório. A segunda, podem fazer em ritmo de samba, jazz, baião, como quiserem, mas coral sob minha regência cantará de forma serena e feliz, como um acalanto. Dois exemplos para duas situações invertidas: Letra triste com ritmo alegre e letra alegre com ritmo lento. Se não prestar atenção na letra, será grande o risco de rir na desgraça e chorar na alegria.

Tem outros casos interessantes, como “os pinheiros brancos de neve” do Piauí ou de Belém, que não cabem aqui. Tudo bem. Sem radicalismos. Usemos a imaginação e pensemos longe... lá, onde a neve cai...

Finalizo com o video abaixo - que considero a melhor interpretação - desejando que todos possam compor uma bonita e adequada trilha sonora para festejar o nascimento de JESUS CRISTO, personagem central, verdadeiro e único merecedor de louvor e honra nesta data. O pagão, bonachão e coadjuvante Papai Noel não morreu e certamente trará o brinquedo “felicidade” para quem nela acredita.

FELIZ NATAL!

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